Estudar: como se ensina? como se aprende isto?

Por Claudia Fenerich, da Direção Pedagógica, e Luiza Peralta, da Equipe do EF1*

“Enquanto preparação do sujeito para aprender, estudar é, em primeiro lugar,
um que-fazer crítico, criador, recriador, não importa que eu nele me engaje
através da leitura de um texto que trata ou discute um certo conteúdo que me
foi proposto pela escola ou se o realizo partindo de uma reflexão crítica sobre
um certo acontecimento social ou natural (…)”

(Paulo Freire, Carta aos Professores)

Estudar é uma atividade essencial no ambiente escolar, quando este é compreendido como espaço de aprender. Nem sempre a escola é entendida assim. E continua sendo um desafio realizá-la como tal.

Como espaço de aprender, a escola exige que todas as ações se voltem para a aprendizagem. Não basta que o professor ensine, o estudante tem que aprender. Não é suficiente que o professor saiba, o estudante tem que saber. Tudo o que já se sabe não é o bastante na escola que é espaço de aprender. Ensinar para que o estudante aprenda exige estudo constante dos professores. Estar na escola para aprender exige estudo constante dos estudantes.

Os professores estudam para ensinar, os alunos estudam para aprender. Claro, ao estudar, os professores aprendem, ao aprender, os alunos ensinam. Ensinar e aprender são ações reversíveis entre os sujeitos que interagem no processo pedagógico, mesmo entre aqueles que desempenham funções distintas no processo, como é o caso do professor e do estudante.

Estudar implica sempre estudar alguma coisa, voltar-se para algo com o objetivo de tentar compreendê-lo. Estuda-se para saber mais, avançar no conhecimento de um conteúdo. Para estudar, é importante fazer um planejamento, ter tempo, contar com local, luminosidade e materiais adequados. Mas é preciso muito mais do que isso. É preciso aprender a estudar, é preciso ensinar a estudar!

Para ensinar a estudar, é necessário envolver os estudantes em todas as etapas do processo de aprendizagem. As intenções pedagógicas e a metodologia do trabalho precisam ser claras e compartilhadas o tempo todo. Os estudantes precisam se apropriar de seus processos de aprendizagem, para também se responsabilizarem por ele.

Na escola, são muitos os conteúdos a serem ensinados, muitos os que devem ser aprendidos. Estudar é um deles, dos mais importantes, pois se trata de uma ação essencial para aprender (e também para ensinar). É preciso aprender a estudar, para saber como estudar e aprender.

Além do conteúdo que se objetiva aprender, estudar envolve também um conjunto de conteúdos que chamamos, na escola, de procedimentais. Esses conteúdos diferem dos conceituais, por dizerem respeito ao saber fazer, e não à compreensão dos conceitos. São exemplos de conteúdos procedimentais envolvidos no estudar: recortar o conteúdo de estudo, buscar fontes adequadas, organizar as informações, extrair palavras-chave e ideias principais de um texto lido, resumir um texto, parafrasear as ideias centrais dos textos, fazer anotações que favoreçam o entendimento, elaborar um planejamento de estudos, reler, refazer, autoavaliar-se, problematizar, registrar dúvidas, formular questões a serem estudadas posteriormente.

Estudar envolve ainda outro tipo de conteúdos: os atitudinais, que dizem respeito à atitude que o estudante deve adotar, seja diante da aprendizagem como um todo ou de situações específicas que se apresentem. Para estudar, é esperado que o estudante adote uma atitude ativa e responsável, cumprindo as etapas previstas, realizando suas tarefas, interagindo na sala de aula, problematizando os conteúdos propostos, autoavaliando-se e conquistando autonomia. Muitas vezes, os conteúdos atitudinais são deixados de lado ou não são devidamente explicitados no trabalho pedagógico, o que compromete a compreensão dos estudantes sobre o objetivo fundamental de todo o processo de aprendizagem e o seu papel de protagonista no mesmo.

Na EDEM, o ponto de partida para ensinar a estudar é situar a criança, o jovem, no lugar de protagonista do processo. É ocupando este lugar que o estudante poderá olhar adequadamente para a sua produção, analisá-la, perceber o que sabe e o que ainda não sabe e desenvolver formas de estudo, para aprender o que não sabe e avançar no que já sabe. Em que momento o estudante está pronto para ocupar este espaço? O que ele precisa ter aprendido para situar-se nele?

Junto com o trabalho com os diferentes tipos de conteúdos, durante todo o percurso escolar, nas várias áreas do conhecimento, são utilizadas diversas estratégias de ensino que envolvem a metacognição. A metacognição é um importante aspecto do ensinar a aprender. Diz respeito às operações mentais que abrem ao estudante possibilidades de se interrogar como sujeito de aprendizagem, para elaborar melhor seu pensamento. Nesse sentido, as atividades são conduzidas pelo professor de modo a favorecer que o estudante se indague sobre o que já sabe, reflitindo sobre as ideias já formuladas, e confronte-se com suas hipóteses atuais, buscando recursos para ir além. Isso é feito, por exemplo, através de roteiros de perguntas que orientam o estudante a analisar seus acertos e erros em relação aos conteúdos propostos e que o instigam a desenvolver novas estratégias de pensamento, levando-o a questionar, problematizar, investigar, reformular teses e reelaborar ideias.

O processo para a conquista da autonomia diante da aprendizagem é contínuo, desdobra-se ao longo da escolaridade e também além da escola. Cada etapa remete a conquistas importantes, que contribuem para a autopercepção do lugar de protagonista que cabe a cada estudante.

No percurso da Educação Infantil ao Ensino Médio, partimos exatamente do lugar a que chegamos: o do protagonismo do estudante no processo de conhecimento. Desde a entrada na escola, com 1 ou 2 anos, a criança é estimulada a ocupar este espaço de várias formas. Os projetos de estudo desenvolvidos na EDEM, na primeira etapa da escolaridade, partem de curiosidades e interesses de cada grupo turma. A construção de todo processo é coletiva e a participação e contribuição de cada sujeito é fundamental. À medida que a escolaridade avança, os conteúdos propostos se baseiam na seleção curricular prévia. Isso, no entanto, não esvazia o espaço de construção coletiva e individual. A problematização, por exemplo, é uma prática que começa na Educação Infantil e segue até o Ensino Médio, convocando o estudante a dar respostas e desencadeando projetos de estudos individuais e coletivos. A autoavaliação, importante instrumento para o desenvolvimento da autonomia do estudante, é outro exemplo de prática contínua na EDEM.

Ao final do 5º ano, é esperado que o estudante se perceba como responsável por sua própria aprendizagem, sabendo reconhecer aquilo que sabe e aquilo que não sabe e buscando maneiras de avançar em relação a ela. Ainda que o trabalho voltado a ensinar a estudar se inicie sistematicamente no 4º ano, para que o grau de autonomia esperado seja possível ao término do Ensino Fundamental 1, é preciso realizar, ao longo de todo o segmento, uma série de ações e atividades que favoreçam tanto o desenvolvimento de operações mentais quanto de atitudes e procedimentos, como os que já destacamos.

Nesse sentido, o trabalho diversificado, realizado em grupos na sala de aula, é fundamental. Os grupos podem ser formados para atender a diferentes objetivos: focar necessidades específicas que os estudantes aprensentam em relação a um conteúdo, desenvolver a capacidade de expressar pensamentos e compartilhar informações, refazer tarefas com a ajuda do outro etc.

Além de jogos, construídos com conteúdos diversos, o livro didático também é um recurso utilizado para estudos na sala de aula. A correção coletiva é um momento importante, a partir dela, cada estudante pode ser levado a avaliar por que errou, o que precisa fazer para acertar. São muitas as atividades de estudos propostas a partir do erro, já que, para conquistar a autonomia, o estudante deve primeiro poder responder: o que sei? o que não sei? E depois: como faço para saber o que não sei?

Durante a pandemia, quando a escola funcionou de modo remoto, a maior dificuldade dos professores foi acompanhar o processo de construção de cada estudante. Foi muito difícil não poder observar como cada um estava aprendendo, para intervir, direcionar oportunamente as ações pedagógicas. A interação presencial se mostrou fundamental para o processo de construção do estudante. Com a volta para a escola, houve muito o que se retomar, refazer, rever, construir, reconstruir individual e coletivamente. Este ano, com a sala de aula reorganizada, podemos focar mais sistematicamente no ensinar a estudar, desenvolvendo atividades coletivas, individuais e em grupos, para que nossos estudantes aprendam cada vez melhor tudo o que é necessário para poderem avançar em relação ao que já sabem.

Uma escola que é espaço de aprender exige que sua prática pedagógica se organize sempre no sentido de tornar as experiências significativas para os estudantes. Este é o grande desafio que aceitamos enfrentar cotidianamente na nossa escola. Para vencê-lo, é claro, contamos sempre com o apoio de todas as famílias da EDEM!

*Claudia Fenerich é Diretora Pedagógica da EDEM e doutora em Educação pela PUC-Rio.

*Luiza Gatti Peralta é pedagoga e professora da EDEM desde 1991. Sua prática pedagógica está voltada para o ensino de matemática e o uso de tecnologias na sala de aula. É doutora em Educação pela UniRio e pesquisadora na área de Avaliação e Currículo.
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