Nós, educadores no mundo hoje: reimaginar futuros juntos

“Precisamos de uma educação que nos permita ir além do espaço que já habitamos
e que nos acompanhe até o desconhecido”

REIMAGINAR NOSSOS FUTUROS JUNTOS:
Um novo contrato para a educação – RELATÓRIO UNESCO 2021

Por Claudia Fenerich 

A abertura do ano letivo na EDEM acontece antes do início das aulas, com toda equipe pedagógica reunida. É um momento privilegiado para o debate de ideias que remetem às intenções educativas e aos princípios que norteiam o Projeto Político Pedagógico da escola, à forma como concebemos a aprendizagem e aos valores educacionais que adotamos e estão sempre pressupostos em toda prática que realizamos. Nesse encontro inicial, a direção pedagógica apresenta à equipe as ideias gerais que vão orientar o trabalho pedagógico e se desenvolver, posteriormente, nos estudos e reflexões dos segmentos, a partir das práticas cotidianas de cada um.

Este ano, escolhemos o Relatório Reimaginar nossos futuros juntos: um novo contrato social para a educação, publicado pela UNESCO em 2022, para pautar esse encontro e nortear as reflexões coletivas.

O contexto histórico atual, de grande instabilidade na conjuntura mundial e acirrada tensão na sociedade brasileria, se apresenta particularmente desafiador para a escola.

Nos últimos tempos, foram muitos os problemas que atravessaram o espaço escolar, demandando dos educadores superação contínua. Pandemia, isolamento social, aulas online, retorno à convivência presencial, mídias sociais, proliferação de mentiras, guerra de narrativas, negação da vacina e da ciência. Em meio a isso tudo, tem sido árduo ter que enfrentar também a crescente onda de um projeto de educação a reboque de resultados e exigências que muitas vezes se chocam com os objetivos da formação integral que nos propomos a oferecer.

Diante disso, buscávamos, para o momento da Abertura, que nos possibilita sempre projetar algo novo, ideias que nos ajudassem a articular as questões do contexto social e, ao mesmo tempo, valorizar nossas concepções e práticas, afirmar o diferencial do projeto da EDEM. Algo que nos estimulasse a pensar em como podemos fazer mais e melhor, a partir do que já sabemos e fazemos. Foi nessa perspectiva que conferimos o relatório da UNESCO e o escolhemos como orientador.

O relatório foi construído por pesquisadores de diferentes nacionalidades, com a participação de pessoas do mundo inteiro. É um documento que nos orienta e nos fortalece diante de nosso propósito educativo, ao definir a escola como espaço comum para se aprender junto, a partir de princípios como não discriminação, respeito à diversidade, justiça, reciprocidade, aprendizagem participativa, colaborativa, problematizadora, interdisciplinar, intergeracional, intercultural.

Com ele, as intenções educativas da EDEM, explicitadas em documento no final da década de 80 e presentes na prática da escola desde sua fundação, encontram caminhos para fluir. E podemos afirmar que acertamos ao seguir, muitas vezes em sentido contrário à corrente, valorizando as experiências pedagógicas significativas, o trabalho com projetos, a construção do conhecimento, a avaliação processual, a valorização do coletivo, a inclusão, o respeito às diferenças e às singularidades, o processo de desenvolvimento de cada um, o trabalho coletivo e interrelacional, a relação com o ambiente e nosso entorno social.  Escola pode e deve ser lugar de aprendizagens autênticas e relevantes, que exploram o interesse em conhecer e compreender o mundo. Não podemos nos esquecer disso em nenhuma circunstância.

O ponto de partida do relatório é o diagnóstico de que o atual cenário mundial é catastrófico e que tal situação é resultado do caráter predominantemente exploratório das ações humanas, movidas por interesses financeiros sem limites. Diante dessa realidade, dar continuidade às ações no sentido que já está apontado significa caminhar em direção à destruição e à barbárie. É necessário recuar, desviar, tomar um rumo novo. O que já foi feito, imaginado e projetado precisa ser refeito, revisto, reimaginado. Juntos, precisamos reimaginar nossos futuros, imaginar de novo o que será de nós e de nosso mundo.

Em que bases estabelecer um novo contrato social para a educação?

O relatório da UNESCO propõe um novo contrato para a educação com base na relação essencial entre escola e democracia. O momento histórico que vivemos demanda de nossa parte a afirmação incisiva desse vínculo. As democracias precisam se retroalimentar dos valores dos cidadãos, suas ideias e ações, para prosperar. E esses valores cívicos, comuns, fundamentais para o funcionamento das sociedades democráticas, são formados no espaço público (comum) da escola.

Os direitos humanos e os valores democráticos são o conteúdo mais básico da escola, o mais premente, amplo e essencial de todos. A cultura democrática é o ar que se respira na escola enquanto espaço coletivo de convivência, socialização e construção de conhecimento. Nós, educadores, temos um papel indispensável a cumprir na formação de valores baseados nos direitos humanos, valores que são comuns a todos e que, garantem, inclusive, o respeito às nossas diferenças enquanto indivíduos.

De que ponto recomeçar, refazer, reimaginar?

É necessário alterar o rumo dos nossos caminhos, mas também continuar o processo no qual nos constituímos. Não podemos nos desfazer do que somos, para nos refazer em outro sentido. Temos que seguir a partir do ponto em que estamos. À luz dos valores humanistas e das circunstâncias que vivemos hoje, precisamos revalorizar nossas experiências, aprender novas coisas e também… desaprender outras! Reimaginar, reinventar, a partir do que já existe, do que já fazemos, descartar o que não nos serve, quando apontaomos no sentido de uma sociedade mais justa, inclusiva e diversa. Precisamos aprender e desaprender diante dos desafios que o presente nos coloca.

Em que sentido apontar nossos futuros?

Para nós da EDEM, o relatório da UNESCO foi um convite para nos reconectar com nossas concepções de educação e valorizar o que tem valor na nossa prática. Sabemos que, como afirma Antônio Nóvoa, o mais importante que nos cabe, hoje, enquanto educadores é possibilitar aos estudantes “fazer algo comum, juntos, no espaço público” da escola.

Assim, projetamos como objetivo de nosso trabalho em 2023: privilegiar a construção, junto com os estudantes, de dinâmicas de aprendizagem e conhecimento que favoreçam, entre outros, a cooperação, a partilha dos valores democráticos, a interação com questões sociais e grupos diversos da sociedade, a formulação de problemas comuns a serem solucionados juntos e a valorização epistemológica das produções de grupos historicamente desvalorizados.

Nossa intenção é compartilhar o resultado dessas práticas no evento aberto à comunidade que realizaremos em outubro junto com os estudantes da escola. Convidamos as famílias da EDEM a participarem também desse processo, refletindo sobre as ideias que apresentamos e acompanhando nosso trabalho.

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